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quarta-feira, 8 de fevereiro de 2012

Pode ser polêmico ou informativo, depende do ponto de vista

Oi, pessoal, 

Tudo bem?

Hoje farei diferente do habitual, colocarei aqui uma das leituras periódicas que costumo fazer para me informar.
Não quero ser, com isso, radical ao tema. Não quero causar desconforto com a escolha ou decisão alheia.
Trata-se apenas de uma reflexão sobre o assunto.
Saber o que é mito e o que é verdade. 
Aprender a respeitar nossas vontades, conquistar,  garantir e realizar o que queremos.

Sempre a mesma história » BLOG MAMÍFERAS

por Kalu


Um diário de uma ilustre (desconhecida para mim) chamado mãe de primeira viagem vinculado a uma revista de grande circulação vem mostrando o tema de uma maneira bastante tradicional. Uma gestação cheia de ultrassom, uma confiança cega no profissional. O resultado é o esperado: uma indicação de cesárea por bolsa rota depois de poucas horas. E no relato de uma cirurgia como via de nascimento a alegria rápida, o medo e a felicidade de ter um filho saudável nos braços. Um relato comum como ouvimos tantas vezes por aí reforçando a teoria que não basta querer um parto normal. E nos comentários, quase sempre felicitações pelo nascimento, pessoas emocionadas com a história. Está tão comum nascer assim que nem conseguimos ler nas entrelinhas o retrato de nossa sociedade e do perigoso modelo obstétrico que estamos inseridos.
Alcançamos recorde de cesáreas nestas terras brasileiras. Isso quer dizer que existem mais bebês em UTIS, mais mortes maternas e neonatais (uma vez que cesáreas representam três vezes mais risco para mãe e bebê). Nos últimos anos embora a saúde tenha chegado a mais pessoas, a linha de pobreza tenha diminuído, saneamento básico esteja acessível para mais brasileiros, lidamos com um aumento da mortalidade materna e neonatal. E hoje quem adensa esses números são as mulheres usuárias dos planos de saúde, com suas altíssimas taxas de cesáreas eletivas, sem trabalho de parto.
As UTIS neonatais estão repletas de bebês com 37 semanas, bom peso e sem capacidade de respirar sem ajuda de aparelhos – os chamados prematuros iatrogênicos. Assim como a morte de mulheres por infecção e outros fatores associados a uma cirurgia de grande porte.
A história é sempre a mesma: médicos que se dizem a favor de um parto normal e na hora, soltam: temos que fazer uma cesárea por que seu filho pode entrar em sofrimento. “Em relatório encaminhado à Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), a equipe da Fiocruz, que trabalhou em parceria com a Universidade Federal Fluminense (UFF) e a Secretaria Municipal de Saúde do Rio de Janeiro, relatou que, embora 70% das gestantes não tenham manifestado preferência pela cesariana no início da gravidez, 90% delas tiveram esse tipo de parto”.  Não questionamos: qual é o problema? Qual o batimento? Qual é a prova científica da necessidade desta cirurgia? Não questionamos por que estamos demasiadamente fragilizadas com o momento, estamos com medo do desconhecido e felizes com a chegada do ser que, mesmo no ventre, amamos mais que tudo. Temos medo da morte, da nossa, da dele. E, se existe alguém que pode me trazer esse bebê em segurança, por que devo me sacrificar?
E esse médico não acompanha um parto porque ele acredita e foi treinado por anos a fazer a cirurgia com segurança. Ele sabe como agilizar as coisas e como um parto normal tradicional pode ser aterrorizante. Geralmente os primeiros pontos de um residente são dados na vagina de uma mulher do SUS. E ele acredita que está evitando o sofrimento ao intervir cortando o útero desta mulher para ele mesmo trazer a vida. Os cortes precisos, a cauterização das veias, a cola, os medicamentos de alta eficiência fazem da cirurgia um sucesso.
A nossa medicina obstétrica não é baseada em evidência científica. Existem alguns poucos médicos que nadam contra a corrente da obstetrícia clássica e assumem práticas baseados em evidências científicas, como o Parto Domiciliar -  geralmente bebendo de práticas adotadas em outros países.
E por que mulheres que dizem querer um parto aceitam a cirurgia sem grandes questionamentos? Fazemos o que damos conta e defendemos aquilo que vivemos e nos realizou. E um filho saudável realiza. É o que importa, sim. Mas para muitas mulheres o caminho até este momento de ter os filhos no colo é importante, transformador.
Sempre escuto mulheres dizendo que queriam partos normais,  mas tiveram  que ser submetidas a uma cesárea por falta de dilatação, sofrimento fetal etc. Na verdade elas foram enganadas por seus obstetras, que não fazem isso porque são maus, mas porque acreditam que tanto faz a via de parto se mãe e bebês ficarem bem.
Sabemos muito pouco sobre esse universo de parto e maternidade. Delegamos ao médico a total supremacia a este momento e não duvidamos de suas indicações. Fazemos isso em muitos outros momentos de nossas vidas. E se entramos em contato com determinado conhecimento e não conseguimos aplicá-lo, podemos questionar a veracidade do mesmo (ou até mesmo desenvolver um comportamento obsessivo que nos leva a criar um personagem fictício para ofender, difamar aquele que simplesmente pensa diferente).
Podemos reforçar nossas escolhas ou procurar outros pontos de vista. Geralmente estes pontos diferentes podem nos ferir.
Há quase 5 anos eu fui convidada a este projeto e através de histórias de mulheres que foram além de indicações de cesáreas, que construíram de fato a autonomia das escolhas, pude saber que era possível fazer diferente e fiz, aos 45 do segundo tempo.
Talvez se eu tivesse permanecido com aquele médico bonzinho, sem equipe humanizada, teria sido submetida a uma cesárea desnecessária. Talvez estivesse em outro espaço defendendo as maravilhas da cirurgia ou dizendo: eu tentei, mas não deu.
O fato é que sempre há tempo de reconstruir uma história. Um parto normal depois de uma cesárea é bem mais difícil, exige muito mais de nós, mas é possível. Isso se pudermos acolher o diferente, olhar para nossas feridas e escolher fazer outros finais para nossa história. Mas enquanto atacarmos o diferente apenas estaremos expondo nossa fragilidade diante de nossas cicatrizes.
E para as “bruxas” que nos citam como radicais, inconseqüentes, o convite para um diálogo adulto e de aprendizado. Quem teve cesárea, necessária ou não, amamentou ou não, bate ou não, o convite eterno para o diálogo adulto e autoral, sem se esconder em pseudônimos.

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